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sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Quiromancia e Quirologia

Qual o valor científico da Quiromancia ?” “Será lícito, à luz da consciência cristã, consultar quiromantes ?”

A palavra «quiromancia» (do grego cheir, mão, e mantéia, adivinhação) significa a arte de descobrir, mediante o exame das características da mão (forma geral, linhas, protuberâncias, cavidades, etc.), o que diz respeito a determinado indivíduo no pretérito, no presente ou no futuro. Em sentido estritamente etimológico, o vocábulo designa apenas a predição do futuro; é, aliás, isto o que geralmente se procura nas consultas a quiromantes.

Distingue-se da quiromancia a «quirologia» ou «quirognomia», estudo da mão que tem a finalidade de descrever não propriamente o currículo de vida da pessoa, mas o seu temperamento ou caráter, seus traços psicológicos e até fisiológicos, excluída toda espécie de adivinhação, oráculos do alto, etc. A quirologia formula seus diagnósticos interpretando cada uma das características da mão como sinal de determinado traço da personalidade do sujeito. — A quirologia pode ser classificada como ciência, predicado este que não convém à quiromancia (ao menos no sentido antigo e clássico), pois esta entra muito nos setores da arte e da Religião.

Na antiguidade já o sábio grego Aristóteles (+322 a. C.) correlacionava as linhas da mão com a duração da vida do indivíduo. Contudo o grande mentor da quirologia foi, no século passado, o capitão D’Arpentigny mediante suas obras «Chirognomie». Paris 1856, e «La science de la main» 1855.
Para apreciar devidamente o estudo das mãos, consideraremos abaixo o seu histórico e os seus princípios doutrinários.

1. O histórico do estudo das mãos

As linhas da mão, desde remota antiguidade, têm. interessado os povos; quiromancia e quirologia costumavam outrora ser cultivadas simultaneamente. Refere-se, porém, que o filósofo Anaxágoras (+428 a. C.), o qual estudou as mãos de Péricles, Sócrates e Eurípides, distinguia uma da outra.

Em particular, os orientais estimavam a leitura das mãos como uma das fontes principais de conhecimento, e de conhecimento frequentemente tido como superior ou esotérico (reservado a iniciados). Na China a quiromancia parece ter sido praticada já por volta do ano 3000 a.C.; lá foram redigidos os primeiros documentos sobre o assunto, documentos que os médicos do país utilizavam para confirmar seus diagnósticos. Até nossos dias a quiromancia está em grande voga no próximo Oriente e no Egito, sendo praticada principalmente nos cafés, mercados e lugares públicos; os árabes a consideram como a técnica mais fácil para se prever o resultado de alguma iniciativa. Da Índia a quiromancia, por meio dos «dukkerippen» ou adivinhos profissionais hindus, espalhou-se por todo o Ocidente, cultivada geralmente pelos boêmios e «gipsies» ou ciganos, que fazem dessa profissão o seu ganha-pão.

No Ocidente cristão a quiromancia até a Alta Idade Média era tida como ciência esotérica, reservada a iniciados. No fim do período medieval caiu na conta de superstição, magia, bruxaria e charlatanismo. No século XVI, porém, os humanistas deram de novo grande prestígio ao estudo das mãos, destacando-se nesse setor os nomes de Paracelso, Cardano, Coclés, Achillini, Giovanni delia Porta; na França dos séc. XVI e XVII quase não havia personagem importante na corte régia ou nas cidades que não consultasse, ou mesmo protegesse contra adversários, o seu respectivo «adivinho da mão». Os escritores da época esforçavam-se por provar que o destino de cada indivíduo está determinado desde o seu nascimento…; não concordavam entre si, porém, na maneira de interpretar as linhas e notas características da mão, o que redundava em desabono de sua tese.

No séc. XIX é que tiveram início na Europa os estudos realmente sistemáticos de quiromancia, estudos encabeçados por D’Arpentigny e Desbarolles, e conduzidos pela razão mais do que pela mística. Até o início do séc. XX, porém, não gozavam de grande prestígio, pois os eruditos, assaz imbuídos de «cientificismo» e positivismo, tendiam a desprezar a quiromancia como se fosse mera função de estados neuróticos, histéricos ou de artifícios fraudulentos.

A titulo de ilustração, vai aqui citada a conclusão do artigo «Chiromancie» do «Grand Dictionnaire universel du XIX siècle» de Pierre Larousse (t. IV, pág. 146):

«Graças a esses dois reveladores (D’Arpentigny e Desbarolles), a quiromancia adquiriu nova voga. Dois homens que não eram destituídos de espírito, podem pois gabar-se de ter de novo lançado grande parte de seus contemporâneos nas práticas dos séculos da barbárie. Seja transitória a sua glória! Quanto a nós, não quiséramos ter a mínima parte nessa regressão tão deplorável quanto imprevista, e declaramos que só demos desenvolvimento à pretensa ciência dos quiromantes para mostrar aos nossos leitores tudo que ela tem de ridículo, e afastá-los, tanto quanto possível, dessa ciência estúpida professada por homens que chamaríamos charlatães se não estivéssemos persuadidos de que quiseram fazer uma brincadeira de mau gosto antes que vergonhosa exploração»

Nos últimos anos as opiniões têm mudado: há autores que, considerando noções recém adquiridas no setor da parapsicologia, da telepatia e da percepção extrassensorial, julgam que os fenômenos de quiromancia têm fundamento objetivo, podendo, ao menos em parte, ser considerados como manifestações do conhecimento paranormal (isto é, conhecimento ao lado do normal, não, porém, contrário a este ou anormal).
Após considerar as grandes idéias que nortearam e norteiam o estudo das mãos, procuraremos tomar posição diante da antiga e da nova formulação do problema.

2. As principais linhas doutrinárias da quiromancia

A quiromancia, na sua origem, supõe de certo modo as concepções que os antigos orientais nutriam a respeito do homem e do mundo, concepções que se poderiam assim reconstituir:

A terra ocupa o centro do universo. Na terra o centro de convergência de todos os elementos é o homem. Este constitui uma pequena síntese do mundo (microcosmos dentro do macrocosmos), de sorte que as peripécias por que passa o gênero humano.podem ter repercussão na ordem ou na desordem do universo e vice-versa. Foram estes princípios que inspiraram a astrologia, arte conforme a qual a natureza irracional e, em particular, os astros influenciam a vida do indivíduo e da sociedade humana; baseando-se nisto, o astrólogo deduz as vicissitudes da existência de uma pessoa, observando os movimentos e as posições dos astros relacionados com tal pessoa (cf. «P. R.» 16/1959, qu. 2).

No homem, considerado como centro do universo, às mãos toca importância especial, pois são o instrumento admirável da atividade humana. Elas constituem como que a síntese de toda a operosidade e, por conseguinte, de toda a vida do homem, já que viver é agir ou desempenhar uma atividade. Em consequência, julga-se que na mão de cada indivíduo, portadora como é de suas linhas, saliências e cavidades características, deve estar desenhado um compêndio de toda a vida dessa pessoa. É este pressuposto de que a mão está correlacionada com a vida do homem e, ulteriormente, com os astros, que explica tenham sido dados aos sinais mais notórios das mãos (principalmente às suas protuberâncias) nomes derivados da Astrologia: fala-se, com efeito, de «monte de Júpiter, monte de Saturno, monte de Apoio, monte de Mercúrio», etc. ; consequentemente, a predição do futuro pelas linhas da mão toma por vezes o nome de «quiromancia astrológica».

Partindo destas premissas, os antigos, desejosos de sondar o currículo da vida de um indivíduo, estabeleceram como que um código (o qual se tornou clássico e até hoje vigente) do simbolismo dos diversos sinais ocorrentes nas mãos. Distinguiram, portanto,

- a planície de Marte, que é a palma ou a parte central côncava da mão, assim chamada por significar a luta do homem nesta vida (Marte era o deus da guerra, em Mitologia). Essa planície está cercada de sete saliências chamadas «montes»; assim
- o monte de Venus, sob o polegar; simboliza o amor, permitindo avaliar-se o grau de sensualidade da pessoa;

- o monte de Júpiter, na base do dedo indicador; representa a ambição e o espírito autoritativo do sujeito;

- o monte de Saturno, debaixo do dedo médio; indica determinado tipo de temperamento: quando saliente, denota, sim, índole pensativa, de aspecto grave; e, quando ausente, caráter leviano, pueril, colérico, com o qual não se pode contar;

- o monte de Apolo ou do Sol, debaixo do anelar; assinala, como seu nome indica, o fulgor da inteligência ou do gênio;

- o monte da Mercúrio, ao pé do dedo mindinho; significa astúcia e perfídia inveterada, quando muito próximo do monte do Sol, ou cinismo e fraudulência, quando mais chegado ao monte de Marte;
- o monte de Marte, na parte da palma da mão inferior ao monte de Mercúrio; representa a coragem, o heroísmo;

- o monte da Lua, na zona compreendida entre o monte de Marte e o pulso; reflete a imaginação, os sentimentos poéticos e a sensibilidade artística (é multo saliente nos sonhadores).

Além disso, observam-se e classificam-se grandes linhas na palma da mão, a saber,

- a linha da vida, que contorna a base do polegar, designando a vitalidade da pessoa;

- a linha da sorte ou da fortuna, que une o punho com o dedo indicador, podendo faltar em algumas pessoas;

- a linha do coração, que percorre a base dos quatro dedos superiores; reflete a afetividade;

- a linha da cabeça, que corre abaixo da linha do coração; denuncia a maior ou menor capacidade de raciocinar e refletir.

Os autores costumam enunciar ainda outras linhas da palma, dotadas de importância secundária, como a da intuição ou de Mercúrio, a da notoriedade ou do Sol, o anel de Venus, etc. Os quiromantes levam em conta outrossim sinais acidentais que por vezes aparecem sobre as linhas e as protuberâncias, classificados como «ranhuras, grades, ilhas, cadeias, ramos, forquilhas, taças, cordas, sóis…». Interessam-se também pela forma dos dedos, admitindo, por exemplo, que polegar rígido denote pessoa teimosa, obstinada; polegar encurva- do para dentro, espírito covarde, excesso de precaução, reserva pessoal; encurvado para fora, caráter débil, renúncia à personalidade; polegar forte e largo, teimosia, tendência à crueldade; curto e grosso, irritabilidade, egoísmo; polegar muito pequeno, caráter incerto e tímido; polegar estreito, firme e reto, autodomínio e vontade forte (tal tabela interessa muito também a quirologia).

Estas e outras modalidades de interpretação dos sinais da mão, dizem-nos os mestres, estão baseadas na experiência atestada por estatísticas. Visto, porém, que estas constituem critério por vezes incerto, compreende-se que os mesmos sinais sejam diversamente interpretados por quiromantes diversos; a filosofia e a mística do observador são muitas vezes chamadas a suprir as lacunas que a experiência deixa abertas. Ademais, para se averiguar a instabilidade do terreno que se pisa, note-se o seguinte: os observadores afirmam que cada nacionalidade apresenta seus traços de mão característicos, e que os orientais não possuem as mesmas linhas que os ocidentais, nem os homens rudes as dos intelectuais; verificam que até no mesmo indivíduo as linhas se alteram, ora reforçando-se, ora debilitando-se, em função do estado de saúde, próspero ou precário, da pessoa. Parece certo que os traços da mão em geral exprimem, antes do mais, a vitalidade, de modo a só se apagar várias horas após a morte real do respectivo sujeito.

Alguns estudiosos atribuem especial importância à atividade cerebral na configuração dos traços da mão: asseveram que nos intelectuais os traços da palma são mais acentuados, ao passo que tendem a desaparecer nas pessoas cuja intelectualidade é atenuada pela doença ou pela preguiça mental, chegando mesmo a se extinguir nos indivíduos’ que, totalmente paralíticos, tenham perdido qualquer contato vital com as suas mãos. Em vista destes fenômenos, os observadores em geral costumam dizer que não basta uma só inspeção de mãos para se diagnosticar o caráter ou o currículo de vida de uma pessoa, mas requerem-se exames sucessivos e sistemáticos, documentados por chapas fotográficas, a acompanhar o consulente nas diversas fases de sua existência.

Acontece que a palma da mão mude notàvelmente a sua configuração de um ano para outro; não hã dúvida, os traços fundamentais permanecem então, mas linhas e sinais menores podem surgir ou extinguir-se imprevisivelmente. O observador tem de notar tais variações para averiguar se os acontecimentos que parecem anunciados por tais mudanças de fato se verificarão; por conseguinte, é sòmente aos poucos que o perito quiromante pode ousar formular um diagnóstico.

Suposto determinado código de interpretação, a aplicação do mesmo não se apresenta de todo fácil. Verdade é que em geral linhas mais acentuadas indicam proporção notória do predicado por elas simbolizado (assim, ensinam os quiromantes, linha de vida longa e não interrompida caracteriza longevidade; breve linha da cabeça denota pobreza intelectual, etc.). Os autores, porém, inculcam que não basta considerar cada traço da mão isoladamente ou de per si, mas que se faz mister interpretá-lo em função /das demais linhas, levando-se em conta as proporções existentes entre as diversas linhas da mesma mão. Ora na maneira de avaliar essas correlações pode haver divergências. — Em geral, após a consideração do conjunto das duas mãos, os peritos concentram sua atenção na mão esquerda, pois esta se apresenta geralmente menos deteriorada pelo uso do que a direita.

3. Uma tentativa de avaliação

Na apreciação do estudo das mãos, é mister ter-se ante os olhos a distinção entre quiromancia (arte de sondar o currículo de vida, principalmente o futuro) e quirologia (análise do caráter ou do tipo psicológico, tal como ele se pode espelhar nas linhas da mão). Feita esta distinção, dir-se-á:

3.1. No setor da quiromancia mesma, é preciso distinguir ulteriormente entre a técnica como era cultivada outrora e a técnica como é hoje abordada.
a) A quiromancia foi até o século passado geralmente associada a crenças filosóficas monistas, fatalistas e a concepções supersticiosas; julgava-se que forcas misteriosas, operantes de maneira imperiosa e inelutável na vida da pessoa, se manifestavam pelas linhas da mão; atribuíam-se a causas, por sua natureza mesma insignificantes, efeitos maravilhosos. Valores religiosos, até idéias místicas, serviam para justificar as predições dos quiromantes, reivindicando para elas autoridade indiscutida.
Ora, na medida em que envolvia o conceito monista ou panteísta de Deus (Deus identificado com o universo) ou crença num pretenso poder sobrenatural dos astros ou dos elementos cósmicos sobre a vida humana, induzindo fatalismo, a quiromancia era contrária não só à fé cristã, mas também à sã filosofia. Com efeito, é inconsistente a tese de que os astros determinam a vida humana, deixando o vestígio de sua ação sobre as palmas das mãos; concede-se sem dificuldade certa influência dos corpos celestes e dos elementos da atmosfera sobre a história do gênero humano e seus grandes acontecimentos; pode-se também admitir que um ou outro indivíduo seja especialmente sensível às fases da lua ou às condições atmosféricas; não há, porém, provas de que tais elementos irracionais caracterizem a personalidade e as atividades de determinada pessoa, marcando o seu currículo de vida, a ponto de lhe tirar a liberdade de arbítrio (veja-se o que está dito sobre a Astrologia em «P. R.» 16/1959, qu. 2).

É este conjunto de fatores que explica tenha o Papa Sixto V, na bula «Caeli et terra» de 5 de janeiro de 1585 («contra exercentes artem astrologiae iudicariae et alia quaecumque divinationum genera, librosque legentes vel tenentes»), incluído a quiromancia supersticiosa de sua época entre as artes divinatórias contrárias à fé cristã; o Pontífice lembrava que o Senhor explicitamente advertiu os Apóstolos de que não está em poder dos homens perscrutar os tempos e momentos dispostos pela Providência Divina (cf. At 1, 7).

Há, porém, quem insista nos documentos da Revelação cristã, desejando justificar a quiromancia pela recurso ao livro de Jó, onde se lê (tradução latina da Vulgata): «In manu omnium Deus signa posuit, ut noverínt singuli opera sua. — Na mão de cada homem Deus colocou sinais, a fim de que reconheça cada um as suas obras» (37,7).

Eis, porém, que a tradução latina citada não corresponde ao teor do original hebraico. Este, referindo-se às tempestades, diz que Deus, ao permiti-las, «suspende a atividade dos homens, a fim de que cada um reconheça por elas a ação de Deus». — Como se vê, o texto bíblico como tal está longe de mencionar nesta passagem sinais na mão… Vão, portanto, seria estabelecer recurso à Revelação Divina em favor da quiromancia tal como era praticada pelos povos pagãos.

b) Acontece, porém, que nos últimos tempos a arte quiromântica tem sido, em círculos de cientistas, emancipada de seu aparato supersticioso, falsamente religioso, para ser cultivada à luz de dados da ciência. Principalmente as energias latentes da alma humana têm sido estudadas nos Institutos de Parapsicologia; tem-se averiguado que muitas manifestações do psiquismo, até época recente tidas como expressões do sobrenatural ou da intervenção de um espírito superior, são fenômenos meramente naturais, isto é, contidos dentro do potencial da alma humana: tais seriam os fenômenos de telepatia, clarividência e de percepção dita «extrassensorial», fenômenos ou casos em que a pessoa conhece objetos ausentes, isto é, separados do sujeito por uma distância mais ou menos considerável de espaço e de tempo.

Na base das experiências parapsicológicas até hoje feitas, bons autores (1) julgam possível que um acontecimento futuro (efeito de certas causas já agora existentes) concernente a uma pessoa seja por esta pessoa inconscientemente percebido à distância; isto faria que a constituição física desse mesmo indivíduo (em particular, as mãos, órgão tão expressivo do homem) ficasse marcada por tal percepção. Um observador então (no caso, o quiromante) estaria habilitado a apreender essa marca de mãos e consequentemente a predizer o futuro, atribuindo determinada interpretação aos sinais averiguados.

(1) Em particular destaca-se François de la Noê, «Le langage de la main. Chirologie et chiromancie», na coleção «Bilan du mystère», no 7. Paris 1958. O autor diz ter mais de trinta anos de experiências e estudos quiromânticos e parapsicológicos. Citamos aqui principalmente as suas Opiniões, sem a intenção de as recomendar, mas apenas visando ilustrar a posição do problema em nossos dias.

Os fundamentos desta hipótese seriam os dois seguintes:
Todo efeito futuro já está, no momento presente, realmente contido em suas causas. Dado, pois, que alguém tenha uma sensibilidade muito apurada, poderá perceber (ainda que no subconsciente apenas) esse acontecimento futuro, percebendo as respectivas causas presentes.
O psíquico influi no físico do sujeito. Por conseguinte, o ato psíquico de perceber acima mencionado poderá deixar vestígios de si no físico (em particular, na palma da mão) do indivíduo percipiente. Um quiromante terá assim fundamento real para predizer o futuro da pessoa assinalada por tal conhecimento dito «extrassensorial».

Um dos autores modernos — François de la Noê — que propõem tal explicação, narra o seguinte exemplo de sua experiência própria:
Após haver observado, durante muito tempo e sistemàticamente, a mão de uma pessoa, De la Noê verificou que repentinamente apareceram uma mancha negra no monte de Venus e um ponto preto na linha da vida dessa pessoa. Dai o observador, aplicando as normas de seu código de interpretação, previu que um perigo de morte ameaçava de perto a pessoa assinalada; não seria fatal, porém, porque outros sinais da mão indicavam a persistência da vida. Ora, de fato, dez dias após a verificação dos sinais recém-oriundos, a mencionada pessoa foi vitima de um desastre, escapando da morte por um triz. Horas depois desse acidente, os dois pontos negros da mão desapareceram…!
François de la Noé assegura que, em sua carreira de estudioso, já se defrontou com numerosos fenômenos análogos, na base dos quais ele propõe a hipótese que atrás referimos (cf. Le langage de la main 85s).

Pois bem. Nessa hipótese não entra elemento religioso arbitràriamente estipulado, isto é, não se apela para uma causa sobrenatural indefinida nem para um poder divino misterioso; também não se pressupõe nem fatalismo nem monismo, ficando a explicação estritamente confinada ao setor da natureza. Por isto a sã filosofia e a fé cristã, a rigor, não se opõem a tal teoria. Esta deverá ser julgada à luz das experiências e das normas científicas sobre as quais se baseia. No estado atual da ciência, a teoria proposta só poderá merecer a classificação de hipótese sujeita a ser confirmada ou talvez reformada à medida que forem progredindo os conhecimentos da Psicologia e da Parapsicologia.

A citada bula de Sixto V isenta explicitamente de condenação a arte que tenta desvendar efeitos futuros não a partir de causas imaginárias (apresentadas por pretensas concepções místicas), mas a partir das causas naturais estudadas pela ciência: «…futuris eventibus ex naturalibus causis necessário vel frequenter provenien-’ tibus, quae ad divinationem non pèrtinent, dumtaxat exceptis. — Ficam excetuados (da proibição) os acontecimentos futuros que sempre ou ao menos freqüentemente dimanam de suas causas naturais, setor este de coisas que não tem que ver com adivinhação».

O que nos interessa na teoria acima exposta, é o seguinte: hoje em dia percebe-se muito bem que alguns fenômenos maravilhosos realmente ocorrem relacionados com a leitura da mão; tais fenômenos, porém, nada têm de comum com a intervenção de misteriosas forças cósmicas; podem, ao contrário, ser devidamente explicados pela ação de faculdades humanas naturais, cujas manifestações vão sendo mais e mais explanadas pelos estudiosos. Destarte a quiromancia perde seu caráter supersticioso ou falsamente místico, para se tornar ciência objetiva, sujeita ao controle da razão. Contudo por enquanto, dada a escassez de dados empíricos seguros, ela versa mais no terreno das conjeturas do que no da certeza. — Não é ilícito cultivá-la, desde que no seu estudo se remova toda espécie de falsa crença religiosa e de superstição.

Infelizmente, porém, a arte quiromântica, tal como é praticada no Brasil, envolve geralmente pressupostos de astrologia e fatalismo, que se opõem à doutrina cristã. Está claro que a um católico fica vedado o recurso a uma técnica assim concebida. É o que explica que a consciência dos fiéis católicos se deva mostrar extremamente reservada, mesmo refratária, diante dos anúncios de jornal e dos cartazes que, comumente espalhados, costumam apresentar quiromantes ao público.

A esta altura, uma questão de curiosidade poderia ser abordada com proveito. Tem-se perguntado porque muito maior é o número de mulheres dadas à quiromancia do que o de varões. — François de la Noê explica isto, lembrando que o varão é mais dado ao raciocínio discursivo e sistemático, ao passo que a mulher é mais intuitiva e dotada de sensibilidade mais vibrátil. Ora o conhecimento quiromântico depende muito mais de intuição do que de raciocínio dialético; ele se prende muito mais ao setor do conhecimento subconsciente e extrassensorial, para o qual as mulheres têm especial propensão, do que ao da argumentação racional (ob. cit. 117-120).

3.2. Quanto à quirologia, ela merece, como dizíamos, apreciação independente da quiromancia. Baseia-se no principio de que notas de temperamento e afetos de alma se podem espelhar no corpo ou na fisiologia do respectivo sujeito; admite que certas características psíquicas estejam relacionadas com traços das mãos.

«Em todos os tempos e países, a medicina averiguou o fenômeno de que em todo indivíduo existe correspondência entre a fisionomia de sua mão e seu estado fisiológico. Os principais dados que podem servir para se formular um diagnóstico de conjunto, são a forma, a coloração e a consistência da mão.

Mão de proporções harmoniosas, cujo dorso é levemente colorido e cuja palma é firme sem ser dura, denota bom estado fisiológico. Mão que apresenta excesso ou deficiência de coloração, indica perturbações de nutrição ou de funcionamento dos órgãos. Ossatura fortemente marcada é sinal de artritismo, ao passo que o linfatismo se reconhece pela alvura da pele e a flacidez dos músculos.

O simples aspecto da mão acusa as grandes linhas do temperamento…

Eis alguns tipos característicos de mãos, aos quais correspondem tendências diversas. Mão estreita e muito longa significa egoísmo, inveja, pusilanimidade. Grande, mas bem modelada: ponderação e confiança em si. Fina e muito curta: suscetibilidade, temperamento difícil. Pequena, mas bem configurada: sensibilidade, intuição, reserva natural. Pesada e de forma irregular: sujeição aos instintos. Grossa, mas ágil: habilidade, tino prático. Carnuda e rechonchuda; espírito agudo e capacidade de adaptação (!). Magra e nervosa: aptidões intelectuais, propensão ao exagero. Larga e dura: grande atividade e tino organizador» (ob. cit. 41-43).

As afirmações acima, ainda que possam ser discutidas do ponto de vista cientifico, não ferem proposições da fé cristã; esta aceita sem dificuldade a tese de que a alma se espelha no corpo. Conscientes disto, os moralistas não veem mal no estudo da configuração somática, em particular das características da mão, que possam estar relacionadas com a configuração psíquica da respectiva pessoa, contanto que esse estudo não pretenda ultrapassar as fronteiras da ciência e apelar para princípios de falsa filosofia ou para teorias de mística fantasista.

Dentro da mesma cláusula também é lícita a grafologia ou o estudo de tal manifestação das mãos humanas que é a escrita ou a caligrafia: da configuração que alguém dá ao traçado de suas letras, não parece haver dúvida de que se podem deduzir notas típicas do temperamento dessa pessoa.
A respeito de quanto acaba de ser dito, ainda se pode citar o juízo do abalizado moralista católico, Pe. Vermeersch: «Per se patet nullam illicitam exerceri divinationem ab iis qui ex vultu, membro- rum dispositione, lineis et partibus manus, scripturae notis, temperiem corporis, immo etiam animi propensiones et affectus probabiliter coniciunt. — Evidentemente não praticam adivinhação ilícita aqueles que, baseando-se nos traços do rosto, na disposição dos membros, nas linhas e na estrutura das mãos ou nas características da escrita de uma pessoa, deduzem conjeturas prováveis a respeito das condições somáticas, e até mesmo a respeito das tendências e dos afetos de ânimo dessa pessoa» (Theologia Moralis II. Roma 1928, n. 244).

Por fim, ainda uma observação. A mão compreende duas partes: a palma e os dedos. Ora verifica-se que o estudo da palma da mão e de seus sinais característicos, embora possa ser executado no plano da quirologia (ciência racional), tende insensivelmente a se tornar quiromancia (intuição, adivinhação, arte). O mesmo não se dá com o estudo dos dedos, que se processa geralmente dentro das normas da estrita quirologia.

FONTE ELETRÔNICA;


O discernimento de espíritos

1. Que significa espírito nesta expressão ? Significa uma maneira especial de julgar, amar, querer, agir; uma tendência ou mentalidade particular da alma, por exemplo, uma inclinação à oração, à penitência ou, ao invés, à contradição; é desse modo que falamos de um espírito de contradição ou ainda, de insubordinação.

2. Como classificamos na espiritualidade os diversos espíritos? Classificamos geralmente em três tipos de espíritos: o divino, o diabólico e o humano.

Que é o espírito divino? É a inclinação interior da alma para julgar, amar, querer, agir de modo sobrenatural; por isso, nos inclina a fugir do pecado pela mortificação da carne, pela humildade, e a tender para Deus pela obediência, piedade, fé, confiança e caridade, afetiva e efetiva. O espírito divino verifica-se particularmente nas inspirações do Espírito Santo segundo os sete dons.

O espírito divino se encontra em estado latente nos principiantes e de modo mais manifesto nos aproveitados e nos perfeitos, mais dóceis ao Espirito Santo. Pela inspiração divina, há unidade numa grande variedade de virtudes, de dons, de vocações contemplativas, ativas e apostólicas. É conforme esta variedade que distinguimos o espírito de cada família religiosa, que declina na medida que dele se afasta e se renova, ao contrário, quando a ele retorna.

Que é o espírito humano, ou espírito de natureza? É a inclinação para julgar, querer e agir de modo demasiado humano, segundo a natureza decaída, que tende para sua vantagem pessoal, para sua própria utilidade; é o espírito do egoísmo e do individualismo. Então, a prudência é vista mais como uma virtude necessária para evitar os inconvenientes, que como uma virtude positiva que tende ao bem honesto e dirige retamente as virtudes morais. Por esta prudência da carne, coloca-se a mediocridade, no sentido pejorativo do termo, no lugar do justo meio da virtude.

Esta mediocridade é um meio termo entre o bem e o mal e, inspirando-se no utilitarismo, ela permanece no centro da base do triângulo para fugir aos inconvenientes do vício, mas não por amor a virtude. Ao contrário, o justo meio termo da virtude é como o cume do triângulo formado entre dois vícios opostos um ao outro. Assim, o justo meio-termo da virtude da força está entre a covardia e a audácia temerária. Este justo meio-termo eleva-se mais e mais com o progresso das virtudes. É mais alto na temperança infusa que na temperança adquirida. Do mesmo modo, a mediocridade sempre diminui a elevação das virtudes teologais, como se existissem « por si sós, em um meio-termo », como se o homem pudesse ter demasiada fé em Deus, demasiada esperança em Deus, demasiado amor a Deus, assim como pode amar demasiadamente a própria pátria, amando-a mais que a Deus. O falso meio-termo da mediocridade permanece na base e não busca jamais o cume da perfeição.

Este espírito de natureza engendra a tibieza e, enfim, o desgosto. Predispõe ao pecado mortal pelos pecados veniais cada vez mais deliberados. No entanto, o espírito de natureza tem, por vezes, um lirismo próprio, que se manifesta no sentimentalismo, na afetação na sensibilidade de um amor que não existe o bastante na vontade. Mas decai rapidamente do lirismo romântico à prudência da carne e à « loucura » da qual falava São Paulo, que julga de todas as coisas, mesmas as mais elevadas, pelo que há de mais baixo, segundo as satisfações da sensualidade ou do orgulho (cf. S. Tomás sobre a prudência da carne e a loucura, IIa-IIae, q. 55, q. 46)1.

Que é o espírito demoníaco? É uma tendência para julgar, querer e agir conforme uma inspiração perversa e diabólica. Este espírito manifesta-se claramente nos ímpios, em seu orgulho, luxúria e arrebatamento, mas, no momento da tentação, aparece em estado latente nos outros.

Em toda alma predomina um destes três espíritos: nos ímpios, o espírito demoníaco, nos tíbios, o espírito de natureza; nos iniciantes que se mostram generosos na via do Senhor, domina já o espírito de Deus, ainda que neles, por vezes, o espírito de natureza ou mesmo o demoníaco se introduza.
Que significa, enfim, discernimento, quando falamos em discernimento dos espíritos? É o julgamento que consiste em discernir exatamente por qual espírito é normalmente movida tal pessoa. Ora, o discernimento pode ser adquirido ou infuso :

Se é adquirido, tem sua origem no influxo da teologia moral e na prudência adquirida unida à prudência infusa, e é mais ou menos aperfeiçoado pela inspiração do dom do conselho. Se é infuso, é a graça gratis data, chamada por São Paulo (1 Cor 12, 10) « discernimento dos espíritos ». Ela é muito rara. No entanto, um bom diretor espiritual, piedoso, virtuoso e prudente, recebe, mui freqüentemente, graças de estado que podem, de algum modo, pelo fato de serem de utilidade ao próximo, conduzir a uma graça gratis data; elas aperfeiçoam sua prudência e as inspirações do dom de conselho.

Qual é o princípio fundamental do discernimento dos espíritos ?
É o princípio formulado por Nosso Senhor, a saber: «toda a árvore boa dá bons frutos, e toda a árvore má dá maus frutos. Não pode uma árvore boa dar maus frutos, nem uma árvore má dar bons frutos. Toda a árvore, que não dá bom fruto, será cortada e lançada no fogo. Vós os conhecereis pois pelos seus frutos» (Mt 7, 17-20). Ora, os frutos são as virtudes, os dons do Espírito Santo e seus atos. É preciso, pois, julgar pelas principais virtudes, ou seja, em ordem ascendente, pela castidade e mortificação, pela humilde obediência; pela fé, esperança e caridade. É fácil aplicá-las aos três espíritos que distingüimos acima.
DESCRIÇÃO DOS SINAIS DO ESPÍRITO DE NATUREZA

Esta descrição se faz com facilidade por contraste com o espírito divino, observando-se algumas diferenças com relação ao espírito demoníaco. Este espírito natural é, como dissemos acima, uma tendencia para julgar, querer e agir de modo natural e não sobrenatural. De que « natureza » se trata? Não se trata absolutamente da natureza considerada em si mesma, que pode se elevar à ordem da graça, mas se trata quer da natureza decaída e ainda não regenerada pela graça, quer da natureza ainda manchada, que, apesar da presença da graça, conserva as quatro manchas conseqüentes ao pecado original, que se agravam pelos pecados pessoais. Estas manchas nos batizados que vivem em estado de graça estão em via de cicatrização ou cura, mas não há cura perfeita nesta vida. 2.
Infligida à toda natureza humana pelo pecado dos primeiros pais, estas manchas são curadas imperfeitamente no batismo, pois a concupiscência permanece após este novo nascimento, o que nos obriga a um combate espiritual. Assim, com a ajuda de Deus, o homem supera a concupiscência de um modo meritório, como diz S. Tomás (III, q. 69, a. 3). E isto também era conveniente, como está dito no mesmo lugar, para que os homens não viessem ao batismo com o intuito de escapar às penas da vida presente antes que pela glória da vida eterna. Nós somos co-herdeiros do Cristo, « mas isto, se sofrermos com ele, para sermos com ele glorificados ». Ora, estas quatro manchas são agravadas pelo pecado atual que diminui a inclinação natural para a virtude ao trazer um obstáculo: a inclinação para o mal; assim, « pelo pecado (mesmo venial, nos justos) a razão é embotada, sobretudo na ordem da ação, a vontade se enrigesse contra o bem, cresce a dificuldade de bem agir e a concupiscência arde com mais força » (I-II, q. 85, a. 3).
É por isto que o espírito da natureza decaída ou manchada inclina à concupiscência, que é o lar do pecado e, em seguida, à preguiça, à frouxidão no irascível e, por conseqüência, à injustiça na vontade, à negligência, à imprudência ou à astúcia na inteligência. Em resumo, é o espírito do amor próprio, do amor desordenado de si-mesmo ou do egoismo. E este espírito de amor-próprio, como o demonstra S. Tomás, conduz às três concupiscências, isto é, à concupiscência da carne, à concupiscência dos olhos e ao orgulho de vida3.
Estas três concupiscências inclinam enfim aos sete pecados capitais, que estão na origem de outros pecados, freqüentemente mais graves (Ia-IIae, q. 84, a. 4); os sete pecados são: a vã glória, a inveja, a cólera, a avareza, a preguiça ou a tibieza, a gula e a luxúria. Conforme observa S. João da Cruz (Noite escura, 1. I, início), estes sete pecados existem mesmo em relação aos bens espirituais, por exemplo, a gula espiritual, que é o desejo imoderado da consolação espiritual, amada por si mesma e não por Deus, e o orgulho espiritual. Ora, os pecados capitais, aos quais o espirito da natureza inclina primeiramente, leva a pecados mais graves, como a incredulidade, o desespero, o ódio de Deus e do próximo. Assim considerada, a natureza manchada da qual fala S. Tomás, não difere da que fala o livro daImitação de Cristo (1. III, c. 54). Se quisermos discrever o espírito de natureza quanto à mortificação, à humildade, às virtudes teologais, digamos que a ele é preciso aplicar a primeira regra do discernimento, « Vós os conhecereis pois pelos seus frutos » :

1. O espírito de natureza não inclina jamais à mortificação, nem exterior, nem interior, nem a aceitar as humilhações. Como dizem os espirituais : a natureza não quer morrer, mas procura o deleite nas coisas da piedade, com uma gula espiritual que se opõe ao espírito de fé e ao verdadeiro amor de Deus. Após as primeiras dificuldades ou asperezas, aquele que se move por este espírito de natureza não progride mais e abandona a vida interior. Sob pretexto de apostolado, lança-se numa atividade natural exterior, vive na superfície de sua alma; nele, nada há de profundo, confunde caridade com filantropia, humanitarismo e liberalismo. Esta atividade natural se manifesta de três maneiras, em ordem decrescente: 1.) o arrebatamento, o ardor natural; 2.) a precipitação natural; 3.) o movimento natural, ou atividade natural não santificada, em nada inspirada pelo espírito da fé ou pelo amor de Deus.

Sobrevém a contradição ou a provação, então a natureza geme, recusa carregar a cruz e cai, pouco a pouco, no desespero. O fervor inicial não era senão um fogo de palha subitamente extinto. Este espírito é propriamente o egoísmo, com uma perfeita indiferença pela glória de Deus e a salvação das almas. Não é o amor de Deus ou do próximo que detêm o primeiro lugar na alma, mas o amor desordenado de si-mesmo. Mas, para se justificar, este espírito de natureza tem sua teoria; o princípio é o seguinte: não se deve exagerar em nada, devemos evitar os excessos seja na austeridade, seja na piedade; nós não estamos obrigados a tender à perfeição mística, isto seria misticismo. Segundo este espírito, se alguém lê reservadamente um capítulo da Imitação de Jesus Cristo diariamente para seu progresso espiritual, já é um místico. É preciso, como se diz, avançar pela via comum, posto que a virtude se encontra num meio-termo.

Mas eles falseiam este princípio : o sentido verdadeiro é que a virtude moral se encontra num meio-termo e é um cume entre dois vícios, um por excesso, outro por falta, como a fortaleza está entre a covardia e a audácia temerária. É evidente que este meio-termo é, igualmente, um cume que se eleva entre e acima dos dois vícios opostos, um ao outro. Ao contrário, o meio-termo de que fala a teoria dita acima está na base do triângulo que figura o caminho da perfeição. Pois o meio-termo da tibieza não está entre e acima de dois vícios opostos um ao outro, mas entre o vício e a verdadeira virtude, é o meio-termo instável da mediocridade, entre o bem eo mal, e mais perto do mal do que do bem, nem mesmo no meio do caminho entre os dois, como na enumeração das notas escolares que se costuma dar às crianças : muito bom, bom, razoável, mediocre, mal, muito mal. Esta teoria é, pois, a da mediocridade sob as aparências da virtude ; pois, se ela foge dos vícios opostos entre si, é por causa de seus inconvenientes e em razão da comodidade ou utilidade pessoal, não por amor do bem honesto e da virtude. Assim era para outilitarismo de Epicuro e de Horácio. Assim como se diz « vinho mediocre, nem bom, nem mal », podemos dizer: espírito mediocre, obra mediocre.

Ademais, esta teoria da mediocridade recusa admitir, ao menos na prática, que as virtudes teologais não estão, por si mesmas, num meio-termo ; ela rejeita, portanto, as palavras de S. Tomás: « Nós não podemos amar a Deus tanto quanto Ele deve ser amado, nem crer ou esperar nele o bastante » (Ia-IIae, q. 64, a. 4). Devemos, pois, aspirar a uma fé, a uma confiança e a uma caridade sempre maior.

Por mais forte razão, nesta categoria, negligencia-se na prática a necessidade da docilidade às inspirações do Santo Espírito conforme os sete dons. Na carta do Revmo. Pe. de Paredès, Geral da ordem dos Irmãos Pregadores, publicada em 1926, no início da nova edição das Constituições, o espírito natural está descrito assim (pág. 20): « Ainda que a santidade seja, para o homem, o efeito da graça de Deus agindo em nós, ela supõe, no entanto, de nossa parte, um longo e laborioso progresso de purificação e de transformação de tudo o que há em nós, até alcançarmos o total abandono do velho homem, que se perverte nos desejos da carne, e nos revestirmos do homem novo « criado segundo Deus na justiça e na santidade da verdade ». Daí, o espírito de obediência, de abnegação e de sacrifício com o qual devemos todos guardar estas observações com exatidão e perseverança… ».
Contudo, « Toda indulgência humana, todo espírito de pusilanimidade, toda condescendência feita a este ponto por considerações terrestres, toda dispensa ilegítima, sem fundamento nas próprias Constituições, podem ser consideradas como uma prevaricação por parte dos superiores… e, por parte dos sujeitos, como uma renúncia à obrigação de se santificar e de fazer de si instrumentos úteis para cumprir o santo ministério. Ceder a nossa fraqueza, conforme a maneira dita acima, seria mostrar que professamos o estado religioso, não para alcançar o fim que Deus e a Igreja nos impuseram, mas para encontrar uma solução agradável para o problema da vida presente, isto é, para encontrar com mais segurança no estado religioso todos os bens necessário para a vida e ainda nos propiciar mais facilmente vantagens que talvez não gozassemos no século.

« Mas, para que as observâncias regulares produzam em nós todos os frutos de santidade visados pelas Constituições, não basta observá-las de modo meramente material ou literal, nem apenas para evitar a sanção prevista pela lei ou que pode ser imposta pelos superiores, nem para mostrar-se irrepreensível perante os superiores. Para que nossas observâncias sejam para nós meio de santificação… (e de preparação para o santo ministério), é preciso que sejam sobrenaturais em seu princípio e sejam causadas pela graça divina que lhes infunde o ser sobrenatural.

« Na falta deste espírito interior, que é o centro e a fonte da vida sobrenatural… não sobra nada em nós senão o mecânico e o material, nossa piedade pessoal carece de energia vital « como um bronze que soa, ou como um címbalo que tine », ela se enfraquece e perde todo o mérito e nossa ação comum fica, ela mesma, privada de verdadeira orientação e eficácia. Trabalhamos e nos inquietamos talvez demais em nossas atividades; mas nossa atividade não exprime a verdadeira vida interior de fé, esperança e caridade… Ela parece apenas um esforço provocado pela necessidade exterior de agir ou que obedecesse a razões puramente naturais que nos guiam, conscientemente ou não, pelo fato único de favorecerem as inclinações de nossa natureza. Na falta do espírito interior que nos permite triunfar fobre nós mesmos e dá a nosso ministério a vitória sobre os inimigos da salvação das almas, quanto tempo perdido e passado em vão, quantos esforços, quantos sacrifícios estéreis, quantas atividades gastas inutilmente! »

Ao contrário, onde prospera e florece o espírito interior, produz-se os frutos de uma santidade sólida… Então, o valor e a virtude da vocação religiosa se mostra mais claramente… « Este espírito interior se forma em nós pela prática dos meios que a ascese religiosa nos sugere ; ele se fortalece e se aperfeiçoa pelo progresso espiritual nas diversas etapas da mística cristã, como ensina o Doutor angélico. A mística é, com efeito, o complemento da ascese na ascensão das almas a Deus pelos graus da perfeição da vida cristã. Se houve, por vezes, erros a este sujeito, se aberrações práticas prejudicaram largamente nesse ponto a verdadeira piedade, assistimos hoje uma restauração da verdadeira doutrina tradicional que dá às almas sedentas de vida sobrenatural meios de conhecer as realidades místicas ». É nessa vida perfeita que se encontra verdadeiramente o espírito de Deus que renova as almas.

O espírito natural releva-se sobretudo na maneira tíbia de celebrar a Missa, no modo de dizer o ofício, com precipitação e como que mecanicamente, de ocupar-se dos estudos com curiosidade e, em seguida, com preguiça, ou ainda de observar ou antes de não observar o silêncio e outras práticas regulares, e na maneira imperfeita de obedecer, quer incompleta, quer servilmente, como se faria para uma pessoa humana e não para Deus, ou por desejo de obter honras e dignidades.

Notamos, em conformidade com muitos autores, que a celebração da Missa pode ser celebrada dignamente com espírito de fé ou piedade ; também pode ser mais lida que celebrada, como que para cumprir um dever, ao modo de um funcionário ou de um magistrado que cumpre regularmente sua função civil ; por fim, pode serdespachada com precipitação, em vinte minutos, por exemplo, ou mesmo em menos tempo, sem nenhuma piedade e, por vezes, para escândalo dos fiéis. Na primeira maneira, há o espírito de Deus ; nas duas outras, trata-se evidentemente do espírito da natureza. É preciso pregar sobre esse assunto nos exercícios espirituais para o clero.
Que é preciso dizer contra o espírito natural na celebração da Missa?

A celebração quotidiana é útil para todos os padres : 1) em razão do sacrifício que por quatro fins oferecemos a Deus : adoração, súplica, reparação, ação de graças pelos benefícios de cada dia ; 2) em razão da comunhão sacramental, em que recebemos o pão supersubstancial de cada dia ; 3) por causa do grande proveito que daí resulta para a Igreja universal e todos fiéis vivos ou mortos. Ademais, se o padre celebra raramente, falta com seu dever e enterra seu talento na terra. A celebração quotidiana da Missa requer uma preparação digna.

Que fazer, em caso de dúvida, quando ignoramos se tal pessoa que devemos dirigir é normalmente dirigida por um espírito bom ou mal ?

1. É preciso sobretudo examinar sua humildade.

2. Sua mortificação.

3. Sua obediência ao diretor.

4. Ele mesmo deve rezar para receber a luz de Deus.

DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS SINAIS DO ESPÍRITO MAU.

Ao contrário do espírito divino, o espírito diabólico conduz à exaltação do orgulho e, em seguida, lança a alma na confusão e no desespero, assim como ocorreu ao demônio, que pecou por orgulho e segue no desespero eterno e no ódio de Deus. Para conhecer este espírito mal, é preciso portanto considerar sua influência no que diz respeito à mortificação, à humildade e à obediência e, em seguida, no que diz respeito às virtudes teologais. O espírito demoníaco não nos afasta sempre da mortificação; ele difere, assim, do espírito de natureza e, por vezes, até o contraria e conduz a uma mortificação exterior exagerada, visível a todos, que entretém o orgulho espiritual e enfraquece a saúde. Mas não inclina à mortificação interior da imaginação, do coração, da vontade própria e do julgamento próprio, ainda que estimule, por vezes, inspirando escrúpulos quanto à pequenos detalhes e laxismo quanto às coisas de maior importância, como os principais deveres de estado, por exemplo. Ele inspira assim a hipocrisia : « Jejuo duas vezes na semana» (Lc 18, 12).

Este espírito não nos conduz à humildade, mas nos engana pouco a pouco, para que nós nos estimemos mais do que devíamos, mais do que aos outros, com o objetivo de nos fazer rezar ao modo do fariseu: « Graças te dou, ó Deus, porque não sou como os outros homens : ladrões, injustos, adúlteros, nem como este publicano » (Lc 18, 11). Este orgulho espiritual é acompanhado de uma falsa humildade, do fato de confessarmos um pecado pessoal, para que os outros não nos acusem de uma falta ainda mais grave e nos considerem humildes. O espírito mal faz ainda com que confundamos a humildade com a timidez, que é filha do orgulho e teme o desprezo. Do mesmo modo, não engendra a obediência, mas a desobediência ou o espírito servil, conforme as circunstâncias.

Quanto à fé, o espírito mau não inclina nosso espírito a considerar no Evangelho o que é ao mesmo tempo mais simples e mais profundo, por exemplo, não nos fazdizer com atenção e devoção a oração dominical, meditar os mistérios do santo rosário, mas apenas nos interessa ao que é extraordinário e favorece a ostentação, como quando disse ao Salvador : « Se és filho de Deus, lança-te daqui abaixo ; porque está escrito que Deus mandou aos seus anjos que te guardem, e que te sustenham em suas mãos, para não magoares o teu pé em nenhuma pedra. ». Ao que Jesus respondeu :« Também foi dito : Não tentarás o Senhor teu Deus ».

O espírito mau, do mesmo modo, nos incita ao que é contrário à nossa vocação ; por exemplo, leva um monge cartuxo a querer evangelizar os infiéis ou um missionário à vida solitária dos cartuxos. Ou ainda, no que diz respeito à devoção, inspira a rezar à revelia da liturgia, por exemplo, rezar a sexta-feira santa como se fosse Natal ou vice-versa. Do mesmo modo, nas coisas da fé, conduz a novidades dogmáticas, como, por exemplo, no tempo do modernismo, a ler os livros dos protestantes liberais sob pretexto de adaptar nossa fé ao pensamento moderno. Ou, ao contrário, se nossa inclinação natural está em sentido oposto, nos incita a um arcaísmo imoderado, para provocar o conflito entre católicos ; assim, levava os israelistas recém convertidos ao Cristianismo a voltar à lei mosaica ; é contra esta tentação que foi escrita a Epístola aos Hebreus, onde está dito (3, 13) « Exortai-vos uns aos outros todos os dias, para que nenhum de vós se endureça, seduzido pelo pecado. ». Do mesmo modo, o espírito mau altera os dogmas : por exemplo, o da predestinação quandosurge no calvinismo; então se realiza o adágio : corruptio optimi pessima. A corrupção do melhor é a pior das coisas. O demônio conhece muito bem este provérbio e trabalha para a perversão da fé sobrenatural. Ele sabe, com efeito, que não há nada pior, nada de mais perigoso que o cristianismo falseado, que conserva uma certa aparência de verdade, e ele age, por vezes, como um falso Cristo antes de aparecer como Anticristo. Tal como existiu no pensamento de Lutéro e Calvino (não nos protestantes de boa fé), o protestantismo é então alguma coisa de pior e de mais perigoso que o naturalismo, pois é mais sedutor e abusa ainda mais da sagrada Escritura. É verdade que aceita a Escritura, mas para um uso depravado.

O naturalismo prático e, em seguida, teórico, provém muitas vezes do espírito da natureza decaído, mas a perversíssima corrupção dos dogmas sobrenaturais, como no calvinismo, vem do espírito do demônio. Alterar a fé divina é, portanto, podemos dizê-lo, utilizar-se de uma arma de grande precisão, não contra os inimigos, mas contra os próprios irmãos e contra si próprio – é um fratricídio e um suicidio. Assim se explica, em grande parte, a história da pseudo-Reforma quanto ao seu espírito, ainda que muitos protestantes estejam de boa fé, pelo fato de ignorarem o verdadeiro espírito do protestantismo.

Quanto à esperança, o espírito mau trabalha para fazer com que nossa esperança degenere em presunção ; por exemplo, quer-se chegar rapido demais à santidade, e não pouco a pouco, subindo os degraus necessários, nem pela via da humildade e da abnegação. Ele inspira igualmente uma certa impaciênciaquanto à nós mesmos, uma vez que nossos defeitos parecem grandes demais. Por conseqüência, produz em nós a indignação no lugar da contrição, uma indignação que é filha do orgulho e contrária à contrição. Ora, a presunção conduz ao desespero, quando se verifica a impossibilidade de chegar por suas próprias forças ao fim visado : o bem árduo parece então quase inacessível – é a desesperança.

Quanto à caridade, o espírito mau favorece os simulacros que são como um falso diamante ; assim, conforme as inclinações variadas e opostas de nossa natureza, ele inclina algumas a esta falsa caridade para com o próximo que é o sentimentalismo, com uma indulgência excessiva sob pretexto de misericórdia e de generosidade. Em outros engendra um falso zelo : queremos sempre corrigir os outros, mas não a nós mesmos e, vendo a aresta no olho de nosso irmão, nãovemos a trave no nosso olho. De tudo isto resulta o contrário da paz, ou seja, a discórdia. O homem conduzido por este espírito não pode suportar a contradição, não vê senão a si mesmo em sua ofuscante personalidade, e se coloca, inconscientemente, acima de todos os demais, como uma estátua sobre o seu pedestal.

Se este homem cai em um pecado grave e manifesto que não pode esconder, ele se deixará vencer pela confusão, indignação, desespero e, enfim, pela cegueira do espírito e pelo endurecimento do coração. Antes desta falta, o demônio escondia as conseqüências desencorajantes do pecado e inspirava o relachamento ; agora, após a falta, fala da justiça inexorável de Deus, para nos conduzir ao desespero. É assim que forma as almas à sua imagem : após o arrebatamento do orgulho, vem o desespero.

Portanto, se alguém tem uma grande devoção sensível na oração, mas sai dela com maior amor próprio, julgando-se acima dos outros, sem obediência aos superiores, desprovido de simplicidade no que toca seu diretor espiritual, isto é sinal da presença do espirito mau na sua devoção sensível. A falta de humildade, obediência e caridade fraterna é o indício de que se está privado do espírito de Deus. Vamos agora aos sinais deste último.

DESCRIÇÃO DOS SINAIS DO ESPÍRITO DE DEUS

Estes sinais opõem-se aos do espírito da natureza e do espírito demoníaco. O espírito de Deus inclina à mortificação exterior, no que difere do espírito de natureza, mas à mortificação exterior regrada pela prudência cristã e pela obediência, e que não atrai a atenção para nós nem enfraquece a saúde. Este espírito nos ensina, por outro lado, que a mortificação exterior é coisa pequena, se não há, ao mesmo tempo, a mortificação da imaginação, da memória (lembrança dos erros que cometemos), do coração, da vontade própria e do julgamento próprio. Inspira igualmente a verdadeira humildade, que dispõe à perfeita obediência, nos impede preferirmos a nós mesmos que aos outros, não teme o menosprezo, guarda silêncio sobre nossas qualidades ; no entanto, ela não os nega, se existem, mas rende glória a Deus por elas.
O espírito de Deus alimenta nossa fé com o que há de mais simples e profundo no Evangelho, como, por exemplo, o Pai Nosso, fazendo-nos fugir às novidades pela fidelidade à tradição. Esta verdadeira fé sobrenatural nos revela a presença de Deus nos nossos superiores ; assim, aperfeiçoa-se o espírito de fé, porque tudo julgamos à luz dessa virtude. O espírito de Deus torna a esperança firme, preservando-a da presunção ; diz-nos, por exemplo : é preciso desejar ardentemente a água viva da oração, queconseguimos pela via da humildade, da abnegação e da cruz. Por consegüinte, dá-nos uma santa indiferença pelo sucesso humano.

O espírito de Deus aumenta o fervor da caridade, dá o zelo pela glória de Deus e pela salvação das almas, o esquecimento de si mesmo. Assim, pensamos antes de tudo em Deus, depois em nosso benefício. Inclina igualmente ao amor eficaz ao próximo ; nos ensina que a caridade fraterna é o principal indício do progressono amor de Deus. Impede o julgamento temerário, o escândalo sem motivo. Inspira o zelo, certamente, mas um zelo paciente, doce e prudente, que edifica pela oração e pelo exemplo e não se irrita pelas repreensões intempestivas. Produz uma grande paciência nas adversidades, o amor pela cruz, o amor pelos inimigos. Propicia a paz com Deus, com os outros, com nós mesmos e, freqüentemente, a paz interior.

Se ocorre uma queda acidental, então o espírito de Deus nos fala em misericórdia. S. Paulo diz (Gl 5, 22-23): « O fruto do Espírito é a caridade, o gozo, a paz, a paciência, a benignidade, a bondade, a longanimidade, a mansidão, a fidelidade, a modéstia, a continência, a castidade. », com a humildade e a obediência. Se se trata de um ato particular, é mais difícil discernir se provém ou não de Deus. No entanto, se, encontrando-se antes na tristeza, a alma reza e recebe uma consolação profunda, é o sinal da visita de Deus, se esta consolação incita à obediência humilde e à caridade fraterna.

Mas é preciso distinguir o primeiro momento da consolação do tempo seguinte, onde, por vezes, a alma julga por si mesma sobre esta consolação e o pode fazer conforme seu amor próprio. Haverá presunção se desejar graças propriamente extraordinárias, como visões ou palavras interiores ; mas se a alma vive e persevera na humildade, abnegação e recolhimento quase contínuo, não é raro que, em virtude dos sete dons do Espírito Santo, ela receba inspirações pelas quais se conciliam a simplicidade e a prudência, a humildade e o zelo, a firmeza e a doçura. Esta conciliação e esta harmonia constituem sinal claríssimo do espírito de Deus.
O segredo, o silêncio e a cruz são absolutamente necessários àqueles a quem Deus conduz verdadeiramente por vias extraordinárias e estes não as devem manifestar senão ao seu pai espiritual ; caso contrário, há grande perigo de orgulho espiritual. Particularmente perigosa é a disposição de se comprazer nas revelações, de forma dogmática ou profética ; pois elas se acompanham facilmente de ilusões, e mesmo se a primeira inspiração vêm de Deus, freqüentemente vêm a ela se acrescentar uma interpretação humana, mais ou menos errônea, geralmente compreendida de modo extramamente material. Enfim, o espírito que procura êxtases e revelações, se não aperfeiçoa os costumes e a vida, e não faz o homem desconfiar-se de si mesmo, é um espírito de ilusão, sobretudo se todo isto impede a realização do dever de estado e engendra discórdias. Os sinais do espírito de Deus são, portanto, a obediência humilde, a caridade fraterna, a paz e a alegria espiritual radiantes.

PRINCÍPIOS SECUNDÁRIOS DO DISCERNIMENTO DOS ESPÍRITOS

1. No que se apresentaprontamente para ser feito, o espírito que anima alguém se manifestará se, após deliberação, desconfiar-se de si mesmo. No entanto, nesta regra, não se trata do movimento primo primus, nem do pecado de fragilidade, mas de um ato suficientemente deliberado e grave que o hipócrita não pode esconder ; assim se revelou o coração dos fariseus após a cura imprevista do cego de nascimento.

2. Os segredos do coração se revelam nas tribulações. Assim, os verdadeiros amigos permanecem nos dias de tribuação, mas não os demais, como está escrito no Eclesiastico (4, 8). Do mesmo modo, a tribulação é como uma fornalha onde Deus prova seus eleitos, conforme outra passado do Eclesiástico (27, 6) : « O forno prova os vasos do oleiro e a prova da tribulação, os homens justos » . Lê-se no livro da Sabedoria (3, 5- 8) : « Deus, que os provou, achou-os dignos de si. Ele os provou como ouro na fornalha, e aceitou-os como um holocausto. Os justos resplandecerão no tempo da recompensa, propagar-se-ão como centelhas sobre o colmo. Julgarão as nações, dominarão os povos, e o Senhor reinará sobre eles para sempre. » Mas, para isso, a tribulação era necessária ; « Numerosas são as tribulações dos justos » ; sua longanimidade, sua humildade, sua mansidão, sua indefectível perseverança então se manifestam.

3. O poder revela o homem ; pois, quando adquirimos poder e honras, devemos corrigir e governar os outrros, o que importa bem mais dificuldades do que antes fazíamos em nossa vida privada. Com efeito, é preciso mostrar sabedoria, prudência, sem oportunismo e utilitarismo mesquinhos, caridade para com todos e justiça, igualmente, uma firmeza que não teme corrigir os maus, enfim, bem-querer pelos bons servidores que devem ser ajudados. Ver o Diálogo de santa Catarina de Sena, no lugar em que trata dos bons e dos maus pastores.

REGRAS PARA CIRCUNSTÂNCIAS DIVERSAS

1. Nos momentos de desolação, não se deve fazer nenhuma alteração, mas manter com firmeza e confiança as resoluções que já tomamos diante de Deus. Isto é sobretudo verdadeiro caso se trate de uma desolação acachapante, que leva à uma tristeza má onde o espírito perverso será nosso guia.

2. Nos momentos de desolação, é preciso dedicar-se ainda mais à oração, ao exame de consciência e à penitência. Por que ? Porque a desolação, gerada pelo desgosto nos afasta da oração, do exame de consciência e da penitência. Cura-se, portanto, os contrários pelos contrários. Qualquer que seja a causa de que provenha, esta desolação deve ser, para nós, ocasião de uma reação virtuosa ou de um ardor da alma para o serviço de Deus. Ver A Imitação de Cristo, livro I, c. 12 : Vantagens da adversidades ; lê-se o seguinte : « A adversidade lembra o homem de seu próprio coração, de modo que se conheça em exílio e não ponha sua esperança em nenhuma coisa desse mundo ». Assim, pouco a pouco, graças à oração, a tristeza, de maléfica que era, torna-se boa.

3. O espírito mal nos engana atraíndo nossa alma a um bem aparente e, em seguida, nos induz e incita ao mal. Trata-se, propriamente falando, de uma sedução, pior ainda, o demônio se transfigura por vezes em anjo de luz : sob o pretexto de melhorar as coisas inferiores, nos tira da via de Deus, para nos fazer desejar a comodidade antes que a santidade. Provoca, assim, divisões, perturba a paz e semeia a discórdia.

4. Se nos entristecemos por ser menosprezados, é sinal, senão do espírito mal, ao menos de um espírito imperfeito ; portanto, se nos descorajamos quando somos menosprezados, é um mau sinal, sobretudo nos que passam por ser gratificados com os maiores dons de Deus. Pois os que são verdadeiramente tais não se rejubilam apenas destes dons e favores, mas também das adversidades e desprezos, conforme as palavras de S. Paulo (2 Cor 12, 5, 10) : « Quanto a mim, de nada me gloriarei, senão das minhas fraquezas… para que habite em mim o poder de Cristo. Por isso, sinto complacência nas minhas enfermidades, nas afrontes, nas necessidades, nas perseguições, nas angústicas por amor de Cristo ». Assim, como diz Santo Agostinho « o Apóstolo encontrou um tesouro no menosprezo do qual corava o filósofo » (Sermão 160).

Conseqüentemente, o espírito que se recusa a ser menosprezado não é um espírito perfeito ; do mesmo modo, aquele que deixa de renunciar a si mesmo não é de sólida virtude. Pois, do fato de serem conexas, todas as virtudes devem aumentar ao mesmo tempo.

COROLÁRIOS :

1. O espírito que abunda em penitências e é pobre em obediência é imperfeito e tende ao mal de algum modo, porque está demasiado preso à vontade própria ; realiza muitas boas obras, mas não por amor de Deus ; a prova é que não crê nesta humilde obediência que manifesta conformidade com a vontade de Deus.

2. Também não é um bom espírito aquele que é dado ao paradoxo, isto é, que julga habitualmente de modo excepcional ou que vai de encontro à apreciação comum das pessoas prudentes, que tem algo de estranho e artificial : contém mais grandiloqüência que virtude.

3. Também é mau espírito o que inclina a coisas extraordinárias e fala delas abertamente, sem discrição. A razão disso é que todas as virtudes aumentam ao mesmo tempo, pelo fato de serem conexas ; conseqüentemente, Deus não incita a grandes coisas sem inspirar, ao mesmo tempo, uma grande humildade. Assim, a verdadeira magnanimidade difere da impetuosidade da presunção. Ao contrário, é próprio do demônio incitar empresas novas, curiosas, singulares, prodigiosas, inusitadas, provocando a admiração e o estupor para obter as honras da santidade.

O mesmo se passa com alguém que, sem estar solidamente firmado na humildade e obediência, inclina-se a uma vida extraordinária de oração e penitência, sob pretexto de imitar os santos nas suas ações mais admiráveis e menos imitáveis. A construção do edifício espiritual não pode começar pelo telhado, e o pássaro não pode voar antes de possuir asas. Assim ocorre com a alma: se alguém se encaixa nessa descrição e parece voar, não se trata senão de um simulacro de vôo ou de elevação, uma vã e perigosa exaltação.

CONCLUSÃO

De tudo isto resulta claramente que o espírito de Deus manifesta-se sobretudo na humilde obediência e na caridade fraterna, que ama o próximo por Deus com abnegação. Pois a humilde obediência não provém do espírito da natureza que não inclina à humildade, nem do espírito perverso, que é um espírito de orgulho e de desobediência ; ao contrário, a humilde obediência, mesmo nos mais pequenos detalhes, manifesta a progressiva conformidade com a vontade divina.

Por outro lado, a caridade fraterna é o maior sinal do amor de Deus, conforme as palavras do Senhor (Jo 13, 35) : « Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros ». A caridade fraterna é o termômetro sensível da nossa união com Deus ; pois é de modo bem sensível que aparece nossa caridade quando se trata de ajudar o próximo, sobretudo se é difícil e exigente ; então, se o amamos apesar desta dificuldade, é sinal de que nós lhes fazemos o bem por causa de Deus e que, por conseqüência, aumenta nossa caridade para Deus mesmo. Não há duas virtudes de caridade, uma para Deus, outra para o próximo. Não há senão uma só caridade, cujo objeto principal é Deus e cujo objeto segundo é o próximo. O amor visível do próximo manifesta assim o amor invisível de Deus, na medida em que se distingue do sentimentalismo.

Portanto, se a humilde obediência e a caridade fraterna se conservam e progridem numa alma ou numa comunidade, é, pois, sinal de que um verdadeiro amor de Deus aí progride. Por consegüinte, se esta alma carece um pouco de inteligência natural e de energia física, Deus o suplantará pelas inspirações de seus dons de conselho e de força.

(Traduzido por Permanência a partir de www.salve-regina.com )

FONTE ELETRÔNICA;

 

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Desconfieis daqueles que causam divisões...

Rogo-vos, irmãos, que desconfieis daqueles que causam divisões e escândalos, apartando-se da doutrina que recebestes. Evitai-os!Romanos, 16





FONTE ELETRÔNICA;



Maria, a Rainha dos Céus e o Livro de Jeremias (Jer 7,18; 44,7-19; 44,25.)

ACUSAÇÃO PROTESTANTE

"Por que a religião católica chama Maria de 'RAINHA DO CÉU'? Não lemos no livro de Jeremias que quando os israelitas adoraram a deusa falsa e má chamada 'RAINHA DO CÉU' foram PUNIDOS por cultuá-la?"

Em primeiro lugar, os católicos não consideram a Santíssima Mãe do Senhor como deus nem deusa nem nada do gênero!

Em segundo lugar, o fato de que uma divindade pagã fosse conhecida como a rainha do céu não significa que o termo não possa ser corretamente aplicado, num sentido completamente diferente, a Maria. O rei pagão da Babilônia, Nabucodonosor, é chamado de rei dos reis por Daniel (Daniel 2:37), mas isso não impede que Jesus receba o mesmo título (Ap. 17:14; 19:16).

Terceiro, Maria, que todas as gerações "chamarão de abençoada." (Lucas 1:48) tem um motivo legítimo para reivindicar o título de Rainha do Céu. Como cristãos, reconhecemos Cristo como o rei do céu (Mat. 19:23-24). e como Rei da linhagem real de Davi: "Ele será grande, será chamado Filhon do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai (Lucas:1:32). As Sagradas Escrituras referem-se especificamente a Maria como a mãe de Cristo mais de 25 vezes.

Além disso, devemos notar que "a mãe do monarca reinante é conhecida como a Rainha Mãe," (World Book Encyclopedia 2000). Assim, vemos que "Rainha Mãe" denota a mãe (Maria) de um monarca reinante (O Divino Rei, Jesus Cristo).

A Rainha Mãe, "Gebi Rah" em hebraico, era uma insigne honraria, e uma tradição iniciada com o filho de Davi, Salomão. As Sagradas Escrituras mostram que na Antiga Israel ou Judá a mãe do herdeiro designado gozava de um estatuto especial. Natã recrutou Betsebéia e não Salomão em seu plano de confirmar Salomão como rei (1 Reis 1:11-40). Rainha Mãe era uma posição oficial em Israel e Judá. Prestava-se muita atenção na preservação dos nomes das rainhas mães (1 Reis 14:21; 15:2,13; 22:42; 2 Reis 8:26). A destituição por parte de Asa de sua mãe por idolatria (1 Reis 15:13) indica seu caráter oficial. Quando da morte de seu filho, Atalia assassinou seus próprios netos, os herdeiros legítimos, para conservar o poder de que gozara como rainha mãe (2 Reis 11:1-2). A rainha mãe serviu de conselheira de confiança para seu filho [Prov. 31:1). Nas Escrituras, Deus dá uma enorme ênfase à rainha mãe da linhagem real de Davi. Nas Escrituras mais de 25 vezes após a apresentação do rei judeu, a rainha mãe é indicada, e isso todas as vezes. Em todos esses versículos , notem-se as palavras, "e o nome de sua mãe era". Note-se o que o rei faz por sua mãe, levanta-se para saudá-la, homenageia-a e manda porem um trono para ela a seu lado direito.
Vemos assim que Maria tem direito ao título de "Rainha do Céu". Mas onde nas Escrituras Deus diz que terá uma Rainha? Nos Salmos 45:9,12,17 lemos:
"Filhas de reis estão entre suas damas de honra: à tua direita está a RAINHA em ouro de Ofir...mesmo os povos mais ricos IMPLORARÃO TEUS FAVORES. Farei TEU NOME SER LEMBRADO EM TODAS AS GERAÇÕES: portanto os povos TE LOUVARÃO para todo o sempre."

Seu nome será lembrado em todas as gerações. Caiu a ficha? A profecia é realizada em Lucas 1:48: "Pois considerou a humilhação de sua serva: pois sim, doravante TODAS AS GERAÇÕES ME CHAMARÃO abençoada". No Livro do Apocalipse lemos

"Um sinal grandioso apareceu no céu, uma mulher vestida de sol, com a lua sob os pés, e com uma coroa de doze estrelas na cabeça." (Ap. 12:1-2)

Que espécie de mulher usa coroa? As rainhas usam coroas, mas essa mulher parece estar coroada das 'mais altas jóias' da criação, as estrelas, tendo o próprio sol como traje real.

"Enfurecido com a mulher, o dragão foi guerrear contra o resto dos seus descendentes, os que observam os mandamentos de Deus e mantêm o testemunho de Jesus." (Ap. 12:17)

Satã não pôde vencer a mulher [Gen 3:16) então passou a combater seus filhos espirituais, os cristãos, gente que dá testemunho de Jesus Cristo.

Até Martinho Lutero pregou, após a ruptura com Roma, na Festa da Visitação (2 de Julho de 1532) --

"Ela, a Dama acima do céu e da terra, devia ter um coração tão humilde que não se envergonhava de lavar a roupa de baixo ou de preparar um banho para São João Batista, como uma moça servente. Que humildade! Com certeza teria sido mais justo ter preparado para ela uma carruagem de ouro, puxada por 4.000 cavalos, e bradar e proclamar enquanto a carruagem andasse: 'Aqui vai a mulher que está MUITO ACIMA de todas as mulheres e, com certeza, acima de TODA a raça humana.'"

Cinco anos depois, ao pregar na mesma festa, disse Lutero --

"Ela não estava cheia de orgulho por esse elogio, por este imenso elogio: 'Nenhuma mulher é como você! Você é mais que uma IMPERATRIZ ou que uma RAINHA... abençoada acima de toda nobreza, de toda sabedoria ou de toda santidade!'"

(LUTHER'S WORKS 36:208; 45:107 citado em REFUTING THE ATTACK ON MARY de Fr. Mateo, disponível em Catholic Answers)

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MARIA COMO A MÃE DE CRISTO:

Mateus 1:18; 2:11; 2:13; 2:14; 2:20; 2:21; 12:46; 12:47; 13:55;

Marcos 3:31; 3:32;

Lucas 1:15; 2:33; 2:34; 2:43; 2:48; 2:51; 8:20

João 2:1; 2:3; 2:5; 2:12; 6:42; 19:25; 19:26

Atos 1:14

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DEUS RESSALTOU IMENSAMENTE (MAIS DE 25 VEZES) A RAINHA MÃE NA LINHAGEM DOS REIS DAVíDICOS:

1 Reis 2:19 Betsabéia foi, pois, à presença do kei Salomão, para lhe falar de Adonias. E o rei se ergueu para ir ao seu encontro e se prostrou diante dela, e se sentou no trono e mandou colocar um assento para a mãe do rei e ela se sentou à sua direita.

1 Reis 2:20 "Disse ela: Tenho um pequeno pedido a te fazer, não mo negues. E o rei lhe disse: Pede, minha mãe, que não to negarei." (note-se a intercessão da rainha mãe junto ao rei) Vide também:

I Reis 14:21, 31; 15:2,10,13; 22:42;

II Reis 8:26; 12:1;14:2; 15:2, 33; 18:2; 21:1, 19; 22:1; 23:31, 36; 24:8, 12, 15, 18

2 Crônicas 12:13; 13:2; 20:31; 22:2

Há muitas passagens nas Escrituras em que Deus reconhece a mãe de cada um dos reis da linhagem de Davi, após mostrar que a rainha mãe se assenta à direita do rei.

FONTE:

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Pe. Miguel Ángel Fuentes, I.V.E., Exsurge Domini: Maria, a Rainha dos Céus e o Livro de Jeremias (Jer 7,18; 44,7-19; 44,25.). Disponível em : . Acesso em: 23/11/2012. Tradução: Rogério SacroSancttus